quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

a reviravolta

Sê bem vindo, Apocalipse.

Pocahontas da elipse
Apoteose do eclipse.

cataclisma
catapulta
catacumba

Que fecunda cambalhota
dar a volta assim por cima.

Ai que volta mais redonda,
ai que Céu Melancolia.

toda manhã tem gosto de hortelã

Recém-nascido dia
que carrego em meus braços,
oferta-nos a todos
a cura dos cansaços.

Oferece o remédio
concede-nos regaço.

Dia pequenino
de olhos frescos de manhã,
recém estás nascendo
e já me tomas por cristã.

(Mas não sou
E te venero.
Quero ser
tua devota.
Como o mar sempre contou
com a plateia da gaivota).

Por pequena te batizo
Batizando o meu afã.
Tens a sanha da castanha
e a polpa da maçã.

Se teu gosto de manhã
está me assanhando assim...
Vou-me embora à Jaçanã.
Vou-te a ver cantar pr´a mim.

Dou-te nome e dou-te colo.
Eu serei teu talismã.
Em troca de então cresceres
E me dares o Amanhã.

pequena reflexão rumo ao Desocidente

Quanto tempo vai levar até que consigamos
a serenidade para distinguir,
em meio ao turbilhão nevoento das ideias,
o seguinte horizonte?:

Para se orientar, é preciso, antes de tudo,
se desocidentalizar.
Termo-nos Ocidentado
é que foi um Acidente...

Oxalá chegue o dia
em que percebamos
que "saber"
que a "sabedoria"
é SEMPRE SABOREAR.

Estarmos abertos a farejar e sentir-lhes o sabor às coisas, provar o gosto das coisas,
de fato conhecer, apalpar, experienciar,
cada vez e sempre mais.

"A forma mais elevada de pensar é não pensar."

"perpassa levíssima"

viver e ganhar de presente
a palavra Deslindar.
escorrega pela berlinda
a palavra que quer me blindar.
Linda, linda e desliza.
Esvazia e sabe amar.

Quero correr ao teu encontro,
quero de ti provar o gosto
quero roçar no meu
teu rosto..

o belo Verbo

Garboso. Charmoso. Dengoso.
Soberbo. Majestoso. Manhoso.

Soberano meu.

Docinho de mamão
de uma qualquer
minha oração.
Nestes breves leves versos
te declaro minha paixão.

cheio de garbo

A atração que exerce o Verbo
é de longe a mais fatal.
Substância à luz da lua.
Proibido amor carnal.

Declaro devoção
a este Ser Original.
E fico à disposição
do seu golpe mais letal.

Tem início o desfile!
Vêm aí os mais charmosos.
Des lin dar,
so bres tar
e soçobrar.
Cercear
      sobrepor
           sobrepujar.

Vêm aqueles sibilantes
que arrepiam nossa paz:

sussurrar. . .
despir. . .
ronronar. . .

Chega a hora dos infantes,
os que sempre querem mais:

saltitar

       trescalar

rodopiar.

Serenada,
serenada,
fica a alma adorando
o corpo se siderando
pela mesa de sabores:

"O que temos para hoje?
É o Banquete dos Verbos!
Dos tipos os mais diversos,
dos humildes aos soberbos."

O prazer contorce a todos.
As entranhas venerando,
coração saboreando...

"Quero um de cada gosto,
tanto o aroma quanto a cor.
Quero degustar o Verbo
como ele degusta o Amor."

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

um peso e duas medidas

viver para ganhar de presente
a palavra 'sopesar':

delicada moeda de algodão,
flutuante vai caindo
de
savisadamente
o suave peso da palavra,
todo o peso amainado,
enfim.

que palavra mais sublime
do que esta que redime?

feito pena na balança,
a palavra pesa leve,
balançando-me a pensar
neste doce equilibrar,
sou feliz e sou pesar.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

"Nosso ontem vale por todos os hojes do mundo"

Me, mim, comigo...
Te, ti, contigo...
Em meio à aula portuguesa
- perdida entre pensar
o quanto a língua ama
e o quanto faz chorar -
Eis que me flagro
pensando: nós.
Sentindo nós,
frios na barriga
Que uma vida mim-sem-ti
não não vale ser vivida...

O ti, o ti
Carregado de sentir.
Tem ideia mais bonita
que a de um ti todinho ti?
De mim oposto diametral.
Delicioso Outro Verbal.

Como te quero!
Como ti!

Tivesse eu amadurecido tanto
quanto tu
quanto ti
quanto contigo amadureci!
Anos e anos e anos a fi.
Nosso amor não cabe em si:
sol lá si fá dó ré mi.

Imprevisto frenesi,
este sem-querer-te-vi.
Este "sem-querer-vivi"
desde que te conheci..
Coração em tremeli!

Ponho-me a conjugar
comover e discernir:
beber... falar... sorrir...
sofrer... chorar... dormir...

Aula vai chegando ao fim,
retirando o nós de mim.
Mas aqui dentro do peito
teu sorriso canta assim:

-Nós
 é um belo passarinho
que alçou vôo de Ti.


domingo, 14 de outubro de 2012

açucarada

Porque ela choraminga...
Porque ela se lamenta...
Chora quem muge,
muge quem chora.
A vaca é metáfora
que chegou em boa hora.

Te adora quem te adora
porque és menina-senhora.
Porque és tão triste por dentro,
porque és tão grande por fora...

Olhos largos de ternura.
Ar de quem está indo embora.

Que estreita conjugação,
acertada combinação!
Bonita imagem ser-mulher
nos deu a Natureza...

is a joy for ever


"Vai agora, rasga-te, esgarça-te,
abre espaço para a fenda da falta.
Por ali também entra o Amor.

Passai, Soberano!
Atravessai-me com gosto e ardor."

a thing of beauty

certo dia,
mulheres fizemos
o pacto com a tristeza:
"nos empresta o teu charme,
te emprestamos tua essência".



clarão

Quero...
um estado permanente de noite lá fora.
Pois dentro de mim já apagaram as luzes
E todo mundo foi dormir...

terça-feira, 10 de julho de 2012

bruma


O poeta é um passarinho insone,
machucado.
Em estado de alerta,
tem o corpo assustado.

Seus olhos inchados
- enormes -
não dormiram direito essa noite.

O poeta é um passarinho que esqueceu de dormir.

São uns olhos de penumbra,
são uns olhos rabiscados...
Só se mostram quando há sombra.
São espessos e borrados.

(Poessarinho vai pousando
no rosto da cortesã:
É o resto da maquiagem
pelas sombras da manhã.)

São uns olhos de rascunho.
Brilham com a cor do chumbo.
Cor de quem vive no escuro,
cor mulher-de-todo-mundo.

Ai, boemia...
Ai, sono profundo...


O amor é um passarinho que esqueceu de morrer.

lembrete

Tudo o que nos acontece nesta vida é tão inevitável quanto necessário.
Vide Fernando Pessoa:

"(...) A terra é feita de céu.
A mentira não tem ninho.
Nunca ninguém se perdeu.
Tudo é ´strada e caminho."

Ou Jorge Drexler:

"Nada es más simple
No hay otra norma
Nada se pierde,
todo se transforma"

terça-feira, 19 de junho de 2012

pai e mãe

A psicanálise existe para nos ajudar a ser a mãe de nós mesmos.
Para aprendermos a dar conta de nossas próprias frustrações, furos.
Para sermos capazes de oferecer a nós mesmos um colo confortável.

A poesia serve para nos apaixonarmos pelas palavras.
E, de tudo isso, nasce um desnarciso.

ruflar

Mas não me espanta que prefiras sonhar
ao invés de trabalhar.

Não despertamos para viver,
nós vivemos para sonhar!
Para serem horas de dormir de novo..
e fluir.. fluir..
Sempre rumo a não mais despertar.

Que esta vida é um eterno ressonar..
O sono nos devolve à condição de anjos.

pomar

"Como vão os olhos?" - pergunta o avô.
Vão verdes, seu vô, vão verdes..
Em todos os sentidos.
E os tomates que eram tenros
hoje estão apodrecidos.

A cor do amor é desmaduro.

"E pra quando os doces?" - pergunta a avó.
Os doces, minha vó, alguém os salgou.
Roubou-me o açúcar,
um amargo deixou.

Nos lábios e no ventre.
Nem sei bem como te explique..

O amor tem gosto de inseguro.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

eclipse

"Como é duro
amar maduro!"

A criança pula o muro
se espatifa no chão
puro.
Ser adulto deixa um furo!
Antes
o medo do escuro
Do que os frios dedos
do inseguro..

quinta-feira, 31 de maio de 2012

tilintando

meus dedos de louça
lavam copos de cristal.
meus jeitos de moça
afinal não fazem mal.
me enlouçam
me enlouquecem
de amor e castiçal.

Balouçam ao vento
os tantos cristais.
Soluça minha vida
ornada de ais.

embebida

Prazer maior não pode haver...
Sentir o gosto
das lágrimas do outro.
O mais puro gosto
de um bem-querer.
Prazer maior
não sei conceber:
o aroma de nunca
te ver sofrer...

E deitar o ouvido ao solo
e escutar teu coração.
Ser capaz de ouvir a flor
germinando rente ao chão.

Tão
Tão devagar como o foi a Criação.

Tão enraizadamente
quanto a minha ilusão.

sexta-feira, 25 de maio de 2012


as mulheres mais maduras são os mais belos frutos da árvore da feminilidade.
são aqueles que mais perto chegaram do topo, que mais conheceram a vista lá de cima, que mais apreciaram o mormaço das tardes.
são frutos que não murcham, pois, à medida que o tempo passa, mais tenros e adocicados o calor do sol vai deixando..



quarta-feira, 16 de maio de 2012

Eu não quero retirar
tudo aquilo que eu disse..
O que eu quero é perdoar
essa minha maluquice.

O que eu quero é afagar
toda santa esquisitice.
Esperar perambular
o que quis que não se visse.
cabelos
úmidos de frio.

no peito
não mais um vazio.

porto
alegre é o barco

onde
eu ancoro meu rio
receita de ser feliz:

Para tornar-se filho,

basta que se admire alguém.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

sereias súbitas

O poeta é aquele que imprime
suas emoções na natureza.
Nas coisas, animais e flores
para sentir-se menos sozinho.
Porque as coisas, animais e flores
são todo o seu sentimento.
O poeta quando sente
ele é todo natureza:

A matéria do amor
é um perfume inesperado
que vem e faz buraco
de saudade na memória.

A matéria da dor
é um céu enegrecido
pelas nuvens fim-de-tarde.
É um espaço-calmaria
pra nossa melancolia
ser capaz de respirar
quando chega o fim do dia.

A matéria da alegria é um gato
dormindo enroscado
a um raio de sol.

O vento deflorando as violetas.
A gaivota beijando o mar.
A garça à beira-rio
tomando banho de pedra,
barrigando o vento...

E assim vai o poeta,
como hábil escultor
imprimindo em pássaro
esculpindo em nuvem
o seu amor
com lápis de cor.
Lapida em tudo que é morto
quanto é bom ser vivo.
Tudo que um dia foi
e quis ser de novo
emerge a pleno 
no coração do poeta.
Sereias que súbito sobem à superfície.



a flor e a redoma

Seus olhos de rosa
abriram as pétalas.
O olhar petulante
roubou o meu brilho.
O meu coração despetala
em silêncio.

E os olhos pedintes
vão assim me invadindo.
Coração perde uma folha
Cada vez que assim me olha.

E a cada vez que despedaça
A flor que eu tinha a flor que eu era,
Eis que murcha um pé-de-amor
no ardor da primavera.

Ele sereno serve em taça
a sua emoção a minha agonia.
O meu coração caiu numa fria.
Está na sua mão de melancolia.



segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

homo femina

No meio do dia se ouve uma queixa.
No meio da sala da tarde que arde.
E surge uma moça dos lábios de ameixa
Dizendo que a dor se guardou pra mais tarde.

Dizia baixinho
sem fazer alarde:
"Não me deixa...
Não me deixa..."

A moça dos lábios
com a cor da tarde.

No sol deste dia que já vira pó,
"Não quero estar só,
não quero estar só..."

E de dentro do recinto
Através de um fino muro
Eis que escuto, num apuro,
quebradiça voz de vidro...

"Me tira já daqui!
Presa em fêmea, sou menino.
Expurgada para sempre
do Universo Masculino.

Exilada no espelho
do Banheiro Feminino.

No fricote, na frescura.
No decote e na amargura.
Prisioneira indefesa
do País da Formosura."


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

cifrado

bri
bri
o bri do gabriel
me provoca calafri.
o frio do teu el
me derrete
gabrimel.
o gab da tua boca
vem envenenar meu véu.

gabriel caiu do céu,
imprevisto passarinho.

me carrega pro dossel,
quero conhecer teu ninho...

vamos

vem andar de carrossel,
vem entrar no meu caminho!

cavalgar no meu corcel
e piar devagarinho...


terça-feira, 31 de janeiro de 2012

frágil

Ó menina,
ó menina.
Menina que chora
e que mia.
Não duvide nunca
do teu gosto pela poesia!

Como te cai bem essa cor
sobre o riso triste,
o matiz de verniz 
sobre as dores
febris.
A poesia da tua vida
está brincando nos teus cabelos!
Vês?

Ó menina cor dos dias,
não te massacre nunca a urgência
dos teus versos capen
                              guinhos.

Que há se tuas rimas
não rimarem teu sentimento?
O poema também muda
com os humores do tempo.

E é tão bela essa feiúra
que embonita teus versos,

que eles não te condenam
e inda te esperam. 

Em ti confiam.



Não se canse de procurar sua palavra-metade.

doze de junho (a la Quintana)

Ah, igreja da minha rua...
Igreja da minha vida!
É em ti que um dia caso
quando eu for menos dorida...

Quando a vida der mais gosto
que esta hora sofrida,
quem sabe tua parede
ainda seja colorida.

Tua cruz pertence à tarde
Esta tarde tão querida.
Ao final de tuas torres
principia a minha vida.

Ah, pequena 
capela.
Fosse a vida tão cheirosa
quanto rimar cravo e canela!



terça-feira, 24 de janeiro de 2012

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

coquetel

Meu amor é feito vidro.
Pele fria, gosto frio.
Mora dentro de um mundo
Transparente e vazio.
Chorar não lhe encanta;

tem gosto de sal.
E o que nele me espanta
é a cara de mau.

É o jeito de mar
no olhar de cristal.
As pontadas marinhas
que me fazem tão mal.

E as miradas salgadas
neste mar resplandecente
atordoam, confundem..
Meu corpo está dormente.

É quando nas dobras,
nas curvas castanhas
Penetro na fonte
das ondas-façanhas.

Enfim são tranquilos
teus olhos salinos.
Um mar de água doce,
um rio cristalino.