o poeta é o pintor das palavras:
vide Mario Quintana.
"Eu fiz um poema belo
e alto
como um girassol de Van Gogh
como um copo de chope sobre o mármore
de um bar
que um raio de sol atravessa
eu fiz um poema belo como um vitral
claro como um adro...
(...)"
E assim vai o poeta, como hábil escultor/esculpindo em pássaro/imprimindo em nuvem/o seu amor/com lápis de cor./Lapida em tudo que é morto/quanto é bom ser vivo./Tudo que um dia foi e quis ser de novo/emerge a pleno no coração do poeta./Sereias que súbito sobem à superfície.
quinta-feira, 30 de junho de 2011
segunda-feira, 20 de junho de 2011
penosa menina
ó galinha tão gordinha,
tua pena é a minha.
quanto mais eu sei que chocas
quanto mais tu pões teus ovos
mais eu crio engenhocas
e descubro mundos novos.
acomodada à relva
e cantada por Clarice.
teu instinto foge à selva:
no teu bico há só meiguice.
o teu corpo emplumado
bem parece de brinquedo:
de fofura recheado
não esconde um só segredo.
(...)
tua pena é a minha.
quanto mais eu sei que chocas
quanto mais tu pões teus ovos
mais eu crio engenhocas
e descubro mundos novos.
acomodada à relva
e cantada por Clarice.
teu instinto foge à selva:
no teu bico há só meiguice.
o teu corpo emplumado
bem parece de brinquedo:
de fofura recheado
não esconde um só segredo.
(...)
jarro de barro
queria fazer como manoel
que resvala pra dentro de um alçapão.
ali se esconde, espiando palavras:
sapo, pedra, planta, chão.
ah, deitar com a barriga no chão!
ter a barriga fria de sapo...
pedra roliça, pedra sabão.
do sapo a papoula retira o seu papo.
e boa é a planta fincada no chão.
tão fria e tão lisa que escorre da mão.
que resvala pra dentro de um alçapão.
ali se esconde, espiando palavras:
sapo, pedra, planta, chão.
ah, deitar com a barriga no chão!
ter a barriga fria de sapo...
pedra roliça, pedra sabão.
do sapo a papoula retira o seu papo.
e boa é a planta fincada no chão.
tão fria e tão lisa que escorre da mão.
poeira de estrela
No escuro desta sala
dei à luz uma ideia clara.
Eu externo sentimentos,
codifico sensações.
Profissão desargumento:
faz dos verbos, corações.
Faz das verbas, pulsações.
Eu fabrico um pensamento
de amargo dissabor.
Eu transformo o argumento
em poético labor.
E o amargo desamarga...
E já tudo tem furor!
Vamos dar a cara a tapa
às palavras e ao amor.
dei à luz uma ideia clara.
Eu externo sentimentos,
codifico sensações.
Profissão desargumento:
faz dos verbos, corações.
Faz das verbas, pulsações.
Eu fabrico um pensamento
de amargo dissabor.
Eu transformo o argumento
em poético labor.
E o amargo desamarga...
E já tudo tem furor!
Vamos dar a cara a tapa
às palavras e ao amor.
domingo, 19 de junho de 2011
filhos II
São meus esses pupilos...
E eu sou livre para senti-los!
(Eu sou como um vaga-lume
emprestando luz aos grilos).
E eu sou livre para senti-los!
(Eu sou como um vaga-lume
emprestando luz aos grilos).
filhos
Vocês parece que gritam,
que esperneiam dentro de mim.
Berram, chutam, se agitam
num barulho sem mais fim.
Mas me diz: quem são vocês?
Sim: são todos fragmentos...
De quem eu fui, de quem eu era..
Vocês não passam de sentimentos!
Vocês são meus, só meus lamentos.
Com vocês só há quem possa!
Não provocam ferimentos.
A dor minha vira a nossa.
E se eu não abraçá-los,
quem é que vai contê-los?
E se eu não enlaçá-los,
como é que vão-se os medos?
Se eu não envolvê-los...
Quem sou eu se não sou tê-los?
(Mas a ideia fica em meio
Um bocejo sobreveio).
Sou eu que devo abraçá-los!
Eu nasci para contê-los...
E ao sentir que os abraço
Sonho um sonho de camelos.
terça-feira, 14 de junho de 2011
ao pé do Forte (a Drummond)
Nobre poeta que longe te encontras,
para que tão longe,
e por onde te encontras?
Ainda ontem
estavas no Rio.
Curvado ao livro,
sentado ao mar.
Hoje o Rio que está em ti.
Ainda ontem estavas
Misturado à natureza
Cons-tru-in-do um no-vo rit-mo
Afogado de beleza.
Bebendo da cidade
inteirinha realeza.
Hoje, longe te encontras.
Ó poeta e querido mestre,
prestígio e carícia
que corre nos ventos.
Que adentra a espuma
e sopra nos montes.
E vem pelos montes
pra dentro da gente.
pra dentro da gente.
Poeta fino, poeta duro.
No frio do mármore os ralos cabelos.
Teu nariz marmóreo,
teu queixo murmúrio...
(por baixo da pele
sussurram
apelos).
A uma altura da vida
quiseste ficar
como um nosso presente,
à beira do mar.
No calor da calçada
pra gente passear.
No mar estás escrito.
Ontem, moras na cidade.
Hoje ela que te habita.
domingo, 12 de junho de 2011
homo lupus
Por trás dos olhos caninos
Escondem-se homens, meninos.
Homens e meninos
Presos em olhos de cachorros.
E ao uivarem os seus corpos
Nos assustam: tão ferinos!
Mas por trás dos olhos malinos
Menino-cão guarda um segredo.
No pêlo guarda a si mesmo
no fim do jardim
Chora a menina,
Chora o limão.
No pé de tristeza
Do meu coração.
“Chora menina”,
Dizia a avó.
"Não tranca o teu choro,
Que engasga e dá dó."
Chorar é o remédio
para o coração.
Salgado é o remédio:
vou pôr um limão.
E chora a menina
Num dia de sol.
Encharca de mágoa
O branco lençol.
Enxágua na roupa
O quanto está só.
No peito o aperto
O aperto do nó.
"Chora limão,
E lava a minha alma.
Escorre limão,
Parting is such sweet sorrow
porque eu sei que o céu nos guarda
como a dois pombinhos brancos.
Dois pombinhos brancos
enrolados no branco da nuvem...
É o céu que nos protege!
como a duas criaturas
no seu manto aconchega.
com carinho com ternura.
Há calor e acalento.
E sussurra em nosso ouvido:
"corre logo, o resto é vento..."
Não quero aqui estar
quando o amor deixar de estar.
como a dois pombinhos brancos.
Dois pombinhos brancos
enrolados no branco da nuvem...
É o céu que nos protege!
como a duas criaturas
no seu manto aconchega.
com carinho com ternura.
Há calor e acalento.
E sussurra em nosso ouvido:
"corre logo, o resto é vento..."
Não quero aqui estar
quando o amor deixar de estar.
ser e nata
A chuva me cutuca com seus dedos molhados.
Minha alma está fria;
meu coração, lavado.
Quando o chão é de pedra
e o céu é gelado,
meu coração, despesado,
sai voando terraço afora.
A chuva me provoca com seus dedos delgados:
desperta meu senso de bom-amor.
Meu olhar está descansado,
chorar não se usa mais.
o dia que nasce é pra você
eu te amava suspirava
com a força dos meus rins,
com o pulso de uma artéria.
mas de tanto não pulsar
coração se fez miséria.
Dentro em mim corre um fio.
Pela veias, um segredo.
"É você que tira o frio",
"É você que espanta o medo".
E quando vencemos
a curva da noite
E a poeira do sonho
esfarela pra sempre,
no radinho da gente
sempre a velha canção...
"O sol te quer ao meu lado
pra levantar abençoado."
com a força dos meus rins,
com o pulso de uma artéria.
mas de tanto não pulsar
coração se fez miséria.
Dentro em mim corre um fio.
Pela veias, um segredo.
"É você que tira o frio",
"É você que espanta o medo".
E quando vencemos
a curva da noite
E a poeira do sonho
esfarela pra sempre,
no radinho da gente
sempre a velha canção...
"O sol te quer ao meu lado
pra levantar abençoado."
sexta-feira, 10 de junho de 2011
Retrai, filhinha, a tua emoção. Cuidado que o amor te corta o coração.
“Ai, vó!
Como é difícil seguir teus sermões!
Se fossem oferendas
de um bem-querer
de um bem-querer
Em vez de encomendas
deste mal-dizer..."
“Ai, vó!
Ficar sem merenda...
é muito pra mim.
No meu peito se abre
uma fenda sem fim.
Ficar sem abraço,
não dizer que sim.
O que eu quero da vida
é um beijo carmim!
Pedir para dar menos
a quem só dá mais...
Não posso, vovó!
Sou toda demais.
Demais sol que arde
demais coração.
Demais por ser tarde,
por não dizer não."
Menina se ancora
na tarde que chora.
Encosta-se ao ombro
da tarde de amora.
Debruça na ponte
e enrola a tristeza.
E joga o novelo
na correnteza.
"Para um certo alguém
eis minha promessa:
expando meu peito
e abro minhas asas.
E mais que depressa
ponho a vida em brasas
E bem do meu jeitocomigo te casas."
tempestade e após
cada vez mais
cada vez mais
até se abrir como um broche
e ser cedo
no cais.
e já vamos atracar.
relâmpago
ser feliz a vida inteira
é só questão de jeito
questão de maneira..
posso ter nascido triste
mas eu vou morrer faceira!
cor de esmeralda
Marimenina,
mari-flor.
Um pote de vida
recheio de amor.
Faíscas de riso
de puro frescor.
O que se renova
é sempre o amor:
Em cada sorriso
se abre uma flor!
Em cada risada
está teu sabor.
A vida se afirma
Em pleno vigor.
Fonte de águas novas
que nasce neste dia.
Enquanto você cresce
a gente só espia.
Contigo florescemos
Contigo amanhecemos
Até mudar o dia
Enquanto a hora esfria.
É quando percebemos
Na hora da partida:
A semente virou flor
E ela me deu vida!
Encheu o céu de amor,
e já não há despedida.
à primeira amiga, Natália
Numa tarde arredondada
Dobrei a esquina Criança.
Num rasante colorido
Contornei minha lembrança.
Sonhando fiz a volta
Nos contornos de risada.
Às voltas com o balanço,
Voltando da caminhada.
Caminhava balançando
O meu rabo-de-cavalo.
Galopava eu ia andando
Entre amigos e intervalo.
Tudo era festa
Festa era tudo.
Ao redor da brincadeira
Girava o mundo todo.
Dentro da choradeira
Cabia o parque todo.
A bagunça era tanta
Em roda da molecada
Que se brincava de tudo
Que se brincava de nada.
Fim da merenda é fim do recreio:
Esconde-esconde ficava em meio.
Salpicado de gritinhos
Vai o jardim acalmando.
Acalmando os seus brinquedos
Para não dormir chorando.
E amanhecer novo em folha,
laranjeira
Nós, adultos, nos colhemos.
Do passado somos frutos.
Ser criança é uma árvore,
E não existe futuro.
Os adultos que colhemos
São os frutos do passado.
De que maneira vamos
Devorar o quanto brincamos?
aos doze
Manhã, guria preguiçosa, brinca com o Nascente:
Pião, bola, boneca.
Tarde, guria faceira, brinca com o Poente:
Perna-de-pau
pula-corda
bambolê.
Noite, guria bonita, brinca com a Lua:
Uma duas
Três mil estrelinhas.
E a Madrugada, só
só olha de longe
tanta felicidade,
à procura de um amigo...
cravínea
Quem me dera ser a flor
Que quer desabrochar
E com o mesmo prazer
Abraça a hora de murchar.
Aceita anoitecer
Porque sabe eternecer.
Pétala a pétala
vai desnascendo
e em outro mundo
vem amanhecendo.
Desabrocha para dentro
Sem pesar e com carinho.
No seu talo equilibrada
Tem amor por seus espinhos.
Sabe a hora de crescer,
Sabe a hora de parar.
A hora de existir
E o tempo de murchar.
Murchar
Como acabasse de brotar
Perecer
Como acabasse de nascer...
A dor de existir
Não é ter que murchar.
A dor de existir
É só querer desabrochar...
Depois que a gente nasce
Não sabe a hora de parar...
acidus
falar abacaxi
e afundar os lábios
no ácido frio
sentir o gosto
do amarelo macio
tirar do suco o suculento
não é acidental
nem acidulante
abacaxi, teu doce
é lento
e afundar os lábios
no ácido frio
sentir o gosto
do amarelo macio
tirar do suco o suculento
não é acidental
nem acidulante
abacaxi, teu doce
é lento
orvalho, jasmim.
Brotou uma flor no meu jardim!
Se abre faceira
Sorrindo pra mim.
É toda de seda.
Só fala que sim.
Que sim que me quer,
Que cheira a carmim.
Que sim bem que quer
Deitar no capim.
Flor que é da gente
É assim, é assim:
Não importa o que seja
“Te quero pra mim.”
Se abre faceira
Sorrindo pra mim.
É toda de seda.
Só fala que sim.
Que sim que me quer,
Que cheira a carmim.
Que sim bem que quer
Deitar no capim.
Flor que é da gente
É assim, é assim:
Não importa o que seja
“Te quero pra mim.”
mu
A graça maior da vaca
É que ela não faz a menor idéia
Que o seu corpo malhado
É a carne de um poema.
Balança vaquinha do meu coração
Este sino doirado
E o rabicho no chão.
Mimosa querida
De pele malhada,
Donzela fornida
De leite recheada.
Teu balanço é uma graça!
São tuas tetas
São tuas tantas tetas
Que alimentam toda a minha vida.
Detenho-me a mirar-te,
Tuas generosas narinas,
Teus olhos enormes
Melancolicamente redondos...
Ah, vaca... Tu és toda um banquete!
Para os olhos... para a vida!
Para meus olhos pequenos...
o que há para o jantar?
Eu-te-amo, todos sabem,
é o prato principal.
Nutre boca e coração.
Você veio e sem aviso
tirou-me o melhor do cardápio.
E eu fiquei sem escolha,
sem saber meu nome.
Dos males o menor:
escolho morrer de fome.
retrato
Frágil como vidro
A menina se quebrava.
Caía e tropeçava
Onde quer que ela andava.
Murcha como flor
A menina sonhava.
Nascia e arrefecia
A cada vez que acordava.
Um dia
O rio de choro secou
A marcha dos bois tristes
Parou..
Foi então que ela viu
que sob a haste dos seus pés
sob o fino caule
de flor que avermelhou,
de flor que avermelhou,
Um grosso mundo de terra
É tudo. Mas ficou.
Vasta camada de vida
Para a flor que nunca murchou.
beira-mar
Hoje fim de tarde
recém vejo o amor passar.
Estava alegre a marolar,
o barquinho pelo mar.
O namoro a atravessar.
Era um homem e uma mulher
era um barco e um cachorro.
Pairava no ar
o beijo do mar
e ficava nas bocas
um cheiro de amar.
Dentro do barco
havia uma história
Dentro da história
havia um cachorro.
Eles iam e o cachorro
costurava um segredo
Eles vinham e o cachorro
atacava o seu medo
de um dia verem o amor desmanchar.
Quatro patas e um coração.
O que eles têm não é medo não,
o que eles têm
é um escudo protetor,
orelhudo lambedor.
Dentro deles um barco.
Dentro o barco, o amor.
E a cor desse amor é um negro labrador.
fim de tarde
Vovó me endoça de ambrosia
De paçoca e de mamão.
Faz da vida, sobremesa
E me serve uma porção.
Vó de roupão e barriga no forno.
Café com leite e manteiga no pão.
Sossega vovó, que eu sei esperar.
De repente
Tudo está quente:
O leite ferveu
Depois derramou
A hora esfriou...
Vovó, cuida só!
O doce que estavas
a cozinhar em meu coração
Está pronto!
espelho
depois da chuva, a lagoa é um plácido cristal
onde a garça vem mansamente se espelhar.
chapinha respingos
salpicam goticas
a cada passo que avança com seu longo bico.
que tarde bem chovida!
a lagoa é toda dela.
uma cor descolorida
e no lago a donzela.
cristalina a garçela.
garçalina a lagoa.
nunca a chuva foi tão bela!
nunca a tarde foi tão boa.
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