quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

suaves bovinas

as vacas natalinas
estão gordas: noelinas..
há pasto o bastante
para encher as suas panças.

já as vacas pascoalinas..
tão franzinas! perdem o encanto..
por nascerem em data magra
ficam magras de acalanto..

à la Adelia

Quando eu era pequena
mamãe deu-me seus encantos:
espalhou os seus segredos
por todos os meus cantos.

Me chamou de sua princesa
me deu brinco, me deu sonho.
Me alimentou na mesa
onde agora eu me ponho.

Mas um dia me atacou
a vontade: ser mulher.
E a encomenda de mamãe
de não ser mulher qualquer.

"Não vai ser alguém na vida,
tu vais ser mulher na vida!"

Eis que hoje já crescida
com orgulho, mordo os medos.
Saro eu mesma a ferida,
vou catando os arremedos.

"Que é isso mulher,
deixa de ser pequena!"
Vou e brinco: sou morena
e sonho tudo em vermelho.

É pra ti que em mim carrego
todo o amor que existe em ti.
Até o fim.
Até virar mãe.



quente canção

entre o pássaro
e o haver sol
ardente lateja
o rouxinol

onda vai, onda vem

duas meninas,
duas mulheres
entram no mar ao pôr-do-dia.
Lagoa ao fundo, estão se pondo
como o sol, ao fim do mundo.

Caçando ostras
pescando mariscos.
Enredando sonhos
sonhando petiscos.

Marina marinando
Mariana marulhando.

O barulho do mergulho
vai e avança o mar a fundo.
Pés salgados, pés na areia.
O seu corpo está imundo.

Mas o coração mareia.
cada vez mais mareado.
Que gostinho de sereia!
O amor está dançado..

E o destino está traçado.
De onde entraram não podem sair.
Já no mar emaranhadas
pelas ondas vão sumir.


ai, flor de carmim!
assim que tu deres flor,
seja lá quando isso for:

me dá logo a tua cor!
vê se encarna em mim!

amendoeira

Bem em frente à minha vida
se aconchega a passarinha.
Vejo o quanto está fornida.
Vejo nela o que há de minha.

É o tamanho da barriga.
É o estar acomodada.
É nas folhas da urtiga
reclinar-se acocorada.

E o repousar no galho.
E o ventrinho saliente.
É das brigas abrigar-se
esperar e ser paciente.

Até que choca a semente:
Logo, logo, vai botar!
E que ninhada sairá.
A mãe vai passarinhar.

Do ninho redondo
da barriga quente
Cair com estrondo
chegar a ser gente




verdejante

Janaína na janela..
É mesmo a cara dela!
Ver passar um pássaro
E logo virar passarela.

asfalto

Que lugar teria um hipocampo
nesta hiper-cidade
Onde já não há cavalo
Onde não se vê descanso?
Onde todo cavalo é automóvel
E nenhum motorista é manso..

grávida de luz

No palco azul do meio-dia
O sol dança seus trapos de luz.
Ah, como me dá alegria!
Como você me seduz!

Brilha pra nós, lamparina que espia
Roda pra nós, bailarina do dia
A sua saia raiosa que
Nos atinge e ilumina.

Lambe a rua, a alameda
Labareda a vida inteira
Que eu não quero ficar só,
eu quero ficar sol.